A importância das mulheres por trás da IA
Heloisy: a única mulher da primeira turma de Inteligência Artificial do Brasil. Créditos: acervos pessoais de Heloisy Rodrigues e Eduardo Cavalcanti
Ao digitar “mulher bonita” no Google, o algoritmo entrega mulheres brancas, magras e jovens. Heloisy Rodrigues, 24 anos, a primeira mulher a se formar em Inteligência Artificial no Brasil, como Embaixadora Dove pela Beleza Real na Inteligência Artificial, trabalha na reeducação de algoritmos, com base no código Dove de beleza real, para mudar essa realidade, na missão de fazer com que os buscadores passem a entregar diversidade em buscas associadas a beleza.
“A gente precisa de diversidade”, aponta Heloisy, “eu tenho uma percepção da vida diferente dos meus outros 14 colegas que se formaram comigo, que são homens. As considerações que eles vão colocar em pauta ao desenvolver alguma inteligência artificial, algum algoritmo, estão relacionadas à vida que eles tiveram. Isso por si só não é um problema. O problema é quando só tem homens ali. A ideia é que a gente diversifique tanto em gênero como em raça como qualquer diversidade é sempre bem-vinda, porque vai agregar uma nova visão e vai conseguir gerar a IA mais generalista, evitando esses vieses”.
“Precisamos somar percepções para criar uma IA mais saudável”
Heloisy ainda faz um apelo: “parem de usar fotos com filtro, postem fotos reais: porque a IA será treinada com base nas imagens da internet. Se a inteligência artificial se basear em filtro, vai ficar impossível”. De acordo com Heloisy, até 2025, 90% do conteúdo online vai ser gerado por inteligência artificial.
O engenheiro civil fundador do Instituto Brasileiro de Inteligência Artificial e do Blog da Engenharia, Eduardo Cavalcanti, que participa de várias comunidades globais de inteligência artificial, diz perceber que a representatividade feminina no setor está crescendo de forma significativa, o que, para ele, tem refletido nos algoritmos. “A contribuição feminina é essencial para construir soluções mais inclusivas e livres de vieses, e o trabalho da Heloisy na reeducação de algoritmos é um exemplo brilhante de como isso pode ser feito de maneira impactante”.
Esse tipo de reeducação de algoritmos é, conforme explicou Eduardo, um passo fundamental para que a inteligência artificial se configure como uma ferramenta propícia na correção de desigualdades sociais e culturais, se utilizada de forma ética e consciente. Muitos dos sistemas de IA atuais são treinados com grandes volumes de dados históricos que podem conter vieses inerentes às estruturas sociais e culturais preexistentes. Esses vieses, se não forem corrigidos, podem perpetuar desigualdades, seja em decisões de contratação, crédito ou até mesmo na forma como consumimos mídia. Ao trabalhar na eliminação desses vieses, a IA pode ajudar a criar soluções mais justas e inclusivas”. Ele cita como exemplo processos seletivos automatizados e decisões de crédito, que podem não ter discriminação caso os algoritmos sejam reeducados e ajustados com dados mais representativos e diversificados.
O curso
Formada em 2023, Heloisy integrou a primeira turma do primeiro curso de graduação em Inteligência Artificial do Brasil, ministrada pela Universidade Federal de Goiás (UFG). “A inauguração desse curso em Goiás foi um passo importante, principalmente porque descentralizou a educação em tecnologia do eixo Rio-São Paulo. É significativo ver uma iniciativa desse porte no centro do Brasil”, pontuou Eduardo.
“Eu vi no curso uma possibilidade de trabalhar em qualquer área que eu quisesse: poderia trabalhar com saúde, com educação, tudo isso dentro de IA. É uma grande oportunidade para todo mundo”. Heloisy conta que foi também a UFG a primeira universidade brasileira a lançar o curso de Engenharia de Software. “Agora tem centenas de cursos de Engenharia de Software espalhados pelo país. Estavam faltando profissionais na área, a UFG criou o curso para sanar essa dor e a partir disso outras faculdades se inspiram e vão se adaptando e criando esses novos bacharelados”.
Habilidades
Programação, matemática e empreendedorismo: assim Heloisy resume as habilidades que um profissional de inteligência artificial tem que ter. “Raciocínio lógico, resolução de problemas complexos, domínio de ferramentas e linguagens de programação como Python, R e frameworks como TensorFlow e PyTorch, conhecimento em machine learning e deep learning, matemática avançada (como álgebra linear, estatística e probabilidade), habilidades em big data e data analytics. Nas soft skills: pensamento crítico, resolução de problemas, e uma mentalidade de aprendizado contínuo, criatividade e ética em IA”, adiciona Eduardo.
A IA vai roubar empregos?
Outra frente em que Heloisy trabalha é sua startup MaCall, de teleatendimento, que melhora as interações de chamadas em contact centers usando reconhecimento de voz, síntese de fala em tempo real e integrações com bases de conhecimento diversas. Com o lema “IA faz humanos trabalharem melhor”, a startup tem a premissa de que a inteligência artificial não vem para substituir humanos.
“Não dá para exterminar os trabalhadores, porque eles são peças fundamentais do sistema. No caso dos nossos operadores de call center, a gente senta com eles e pergunta o que dá para melhorar, como seria possível ajudar mais. O nosso ponto é ajudar as pessoas a trabalharem de uma maneira mais eficaz e menos cansativa”, explica Heloisy.
Eduardo conta que o Instituto Brasileiro de Inteligência Artificial busca mudar essa percepção de que a IA vai substituir empregos. “Ainda há esse receio e a gente mostra a IA como uma ferramenta que vem para ser o copiloto dos profissionais, ajudando-os a serem mais eficientes. Sem adotar essas novas tecnologias, será difícil competir no mercado futuramente”.
Beatriz Craveiro
Equipe de Comunicação do Confea
Fotos: acervos pessoais de Heloisy Rodrigues e Eduardo Cavalcanti